sábado, 24 de janeiro de 2009

O Consumismo e o Natal

Olhar o Natal doutra forma é necessário e urgente, quer se seja ou não cristão. Não posso deixar de estar de acordo com o texto que se segue e, por isso, o divulgo aqui, agradecendo ao meu sobrinho Cucas que mo enviou.



Tempo de simplicidade

Quem aposta num mundo melhor não pode deixar de pensar em consumir de uma forma consciente e crítica e de optar por um estilo de vida simples.
O Natal, a festa do nascimento de Jesus Cristo, que veio ao mundo num simples e pobre estábulo de Belém, tornou-se, paradoxalmente, pretexto para a mais extravagante orgia de consumo. Um tempo que deveria ser de maior espiritualidade, para podermos acolher devidamente o dom de Deus, deu lugar à mais superficial e materialista época do ano. Em vez de recolhimento, só vemos azáfama e corrida aos centros comerciais.
Para muitos, o consumo é uma forma de compensar a insegurança, a insatisfação afectiva, social e espiritual. Para outros, é apenas uma moda, uma maneira de se conformarem com os padrões sociais vigentes. Gozar o mais que se pode, sem olhar a despesas. Para a maioria, pagar não parece ser um problema, e, quando o é, há sempre a hipótese do recurso ao crédito.
O Evangelho ensina a simplicidade, a sobriedade de vida e a partilha. Por sua vez, a cultura dominante induz à aquisição do supérfluo, ao consumo e ao esbanjamento. A poupança e a austeridade já não se usam. Como se prova pela inutilidade da maior parte das nossas prendas.
O consumo tornou-se o motor da economia. Para crescer, o modelo socioeconómico liberal que nos governa requer muita produção, compra, consumo e desperdício. A publicidade encarrega-se de difundir a «alma» do sistema: compra, usa e deita fora. O contrário do Evangelho, que nos ensina a renúncia, a gratuitidade e a partilha.
Quem aposta num mundo melhor não pode deixar de pensar em consumir de uma forma consciente e crítica e de optar por um estilo de vida simples. Porque não pode esquecer o elevado número de excluídos do «banquete da abundância» e as ameaças que pairam sobre o futuro do planeta.
Ao contrário do que se pensa, o consumo não é um acto privado, que depende apenas dos próprios gostos e capacidade económica. O exagero tem consequências nefastas. Em primeiro lugar para nós: somos submersos pelo lixo que produzimos; padecemos das doenças ligadas à superalimentação; e somos atacados pelas neuroses derivadas de muitas insatisfações e da vida frenética que levamos.
Depois, o nosso consumismo tem por detrás um problema social de dimensão planetária. Uma grande parte do preço do que para nós é supérfluo é pago pelos povos do Sul, que vêem agravar-se ainda mais as suas precárias condições de vida. Se todos os habitantes da Terra consumissem o que nós consumimos, seriam necessários seis planetas para utilizar como fonte de matérias-primas e como lixeira dos nossos desperdícios.
O Norte, que representa apenas 23 por cento da população mundial, consome mais de 80 por cento das reservas da Terra. Deste modo, condena à pobreza os outros dois terços da humanidade.
A produção e o consumo exagerados põem também em causa o futuro do planeta. Na agricultura, o uso maciço de fertilizantes e pesticidas envenena os lençóis de água; os efluentes industriais poluem os rios e os campos; os gases emitidos pela indústria e pelos veículos fazem aumentar o efeito de estufa, que por sua vez está na origem de catástrofes naturais; a sobre-exploração dos recursos empobrece a terra e os seus guardiões.
Uma vida mais sóbria não significa um retrocesso na qualidade de vida, o regresso à antiguidade e a uma alimentação deficiente. Exprime-se num estilo de vida que sabe distinguir entre as necessidades reais e as supérfluas; e tem em conta as exigências espirituais, afectivas, intelectuais e sociais de cada pessoa. Por isso, não esquece a partilha e a doação de si.


José Rebelo
Revista Além-Mar
(Missionários Combonianos)
30Nov2008